Nessa concepção a cultura é um espaço de disputa. Essa disputa coloca a cultura da periferia numa posição de contra hegemonia. Porém, essa condição não lhe tira as possibilidades de fluxo na relação com o hegemônico. Ao transitar, a cultura da periferia amplia o espectro de diversidade e aumenta sua possibilidade de se incorporar ao repertório da cultura comum, conceito formulado por Raymond Williams na sua obra clássica Cultura e Sociedade e que propõe uma visão não hierarquizada da cultura segundo a qual toda a produção simbólica compõe o patrimônio cultural comum a todos de uma sociedade. Ou seja, o grande desafio é dar a todos a condição de serem consumidores e produtores de cultura e assim poderem contribuir para o repertório da cultura comum.
Entendemos que é exatamente a tomada de consciência como produtores, por parte dos artistas e ativistas, que fez surgir um movimento cultural nas periferias de São Paulo. Os moradores tomaram para si a tarefa de construir espaços de produção e fruição cultural em localidades onde, apesar de alguns terem populações com mais de 400 mil pessoas, não existia um equipamento cultural sequer. Esses ativistas tornaram-se poetas, escritores, artistas plásticos, cineastas, músicos. Passaram a ter a atenção de políticas públicas, tanto de acesso a bens culturais como de fomento à práticas, configurando assim um movimento cultural de grande envergadura.
O movimento cultural das periferias mostrou o quanto a cultura é um importante fator de transformação social, justamente porque ela só pode ser entendida dentro das relações sociais. Não se trata de algo que se dá apenas na dimensão do espírito. Essa concepção materialista acaba por colocar a cultura como uma das frentes de combate por uma vida melhor e digna a todos. Sendo assim, entendemos a cultura não só como um setor do mercado no qual os artistas podem se inserir economicamente, mas também um campo de atuação social e política.
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