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A nova escola dos golpistas

A ONG Ação Educativa acaba de publicar um livro que deve interessar a todos e todas que desejam entender o que se passa hoje na educação brasileira: A ideologia do movimento da Escola Sem Partido.

Criado em 2004, o movimento Escola Sem Partido (ESP) ficou mais visível nos últimos anos. Em 2015, ao lado do Movimento Brasil Livre e Revoltados Online, o ESP foi às ruas pedindo o impeachment de Dilma. Segundo um dos 20 autores que escrevem neste livro, Salomão Ximenes, o ESP é “a mais ruidosa articulação social que se constituiu contra o reconhecimento, no Brasil da diversidade enquanto componente necessário do direito à educação escolar” (p. 50).

A ofensiva contra a política educacional implementada a partir de 2003 (é de 2003 a alteração da LDB que instituiu o ensino de História e Cultura Afro-brasileira nas escolas de Ensino Fundamental e Médio), começou, abertamente, pela mídia, em 2007, criticando o suposto “pensamento de esquerda” dos livros didáticos, comenta outro autor, Roberto Catelli Jr (p. 85). Catelli cita o jornal O Globo e a Revista Época. Na prática, o que o ESP fez foi retomar, em 2014, o debate sobre a “ideologia nos livros didáticos” fomentada pelas Organizações Globo.

Outra análise muito elucidativa é a de Eduardo Girotto. Para ele, a ideologia do ESP reza pela mesma cartilha da política educacional de Geraldo Alckmin de mudar o currículo e reorganizar a Rede sem a participação de professores, alunos e pais (p. 71). Essa política está sendo implementada pelo governo Temer (Reforma do Ensino Médio), direcionada por fundações empresariais. Trata-se de um movimento que busca o “controle ideológico” e a “difusão dos interesses de um grupo especifico” de “combate à pluralidade” e à “multiplicidade de experiências”, menosprezando “os sujeitos, suas práticas cotidianas, seus desejos, sonhos e perspectivas” (p. 73). Como está acontecendo em São Paulo, esse movimento pretende agora construir “cadernos didáticos para alunos e professores a serem aplicados, de maneira padronizada, em todo o território nacional” (p. 73). Estudantes e professores estão reagindo, ocupando escolas: “não aceitam mais o discurso de que a escola é a preparação para a vida e por isso não querem deixar a vida do lado de fora da escola” (p. 74).

Segundo Joana Salém Vasconcelos, o movimento ESP combate a autonomia da escola pública porque ela se tornou um “lugar de socialização dos mais pobres e dos mais negros” e um “espaço implacável de liberdade” (p. 78-79). A referência do ESP é a política educacional do governo Alckmin: para retomar o controle do currículo, o governo de São Paulo instituiu a política de bonificação para os professores com melhor desempenho no SARESP, “atrelando a nota de seus alunos em uma prova elaborada pelo próprio governo”, baseada em parâmetros homogêneos “desconsiderando suas particularidades sociais, culturais e regionais” (p. 79). Esta diretriz de bonificação docente “está sendo anunciada em âmbito nacional pelo governo Michel Temer, dentro de um documento intitulado Travessia Social, formulado pela Fundação Ulysses Guimarães” (p. 79).

Para Denise Carreira, o ESP “propaga a ideia de que a política é algo ruim para a sociedade” como se fosse ruim “expressar nossas opiniões, aprender a ouvir as opiniões dos outros, dialogar, conhecer a realidade para além das aparências e preconceitos, pesquisar o porquê das coisas, negociar soluções em prol do interesse público. A política se refere ao poder de decidir as coisas importantes na sociedade. Se acreditamos que a política é coisa ruim, como defende o ESP, deixamos de participar das decisões que afetam nossas famílias e nossas comunidades” (p. 130).

Depois de ler este livro, o leitor terá mais clareza do que está acontecendo na educação brasileira hoje. O ESP não é um movimento isolado. Ele faz parte de uma grande ofensiva de setores da Mídia e do Judiciário, de partidos políticos de direita, empresas e fundações privadas, contra direitos conquistados. Ficou claro para mim que a ideologia do movimento ESP tornou-se o núcleo central e eixo estruturante da política educacional do governo golpista. Paulo Freire, patrono da educação brasileira, é o principal alvo dessa política. Precisamos rechaçá-la.

Moacir Gadotti
Presidente de Honra do instituto Paulo Freire
Professor aposentado da Universidade de São Paulo

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