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O Levante

Quero iniciar meu discurso com a célebre frase da lendária Lélia Gonzalez: “o lixo vai falar, e numa boa”. E eu complemento que será sem massagem!

Eu sou as ruas e as quebradas. Represento as vozes de mulheres que foram apagadas pela história. Sou artista e ativista. Sou a inimiga número um do Estado. Sou o pesadelo da classe média. Sou aquela que o sistema tentou matar. Sou também como as outras, porém sou tantas coisas e também, às vezes, não quero ser nada disso.

Na real, sou Nenesurreal.

Simplesmente aquela preta que é mãe, avó, amiga, educadora, namorada, que há 50 anos é sobrevivente e narradora de uma guerra sem fim.

Meus relatos são transmitidos através dos muros. Com os sprays, traço a minha revolução. Por onde passo, deixo as minhas marcas coloridas, um universo sem contos e sem fadas, apenas mediando o caos.

Hoje, quero saudar as mulheres pretas, quero saudar as mulheres pretas artistas.

Quero saudar as minhas colegas grafiteiras pretas, que quase desistiram e também as que desistiram.

Quero também saudar as mulheres pretas que morreram para eu chegar até aqui.

Sou a terceira mulher e a segunda mulher preta a ser homenageada por reconhecimento pela trajetória pessoal e do graffiti e assim desejo que isso se torne algo comum. Quero olhar ao meu lado e ver mais mulheres pretas comigo, ocupando as ruas e em todos os espaços possíveis, pois nós resistimos e existimos.

Ser quem somos, não deveria ser um pesar e sim uma grande dádiva, pois carregamos na pele a realiza das nossas ancestrais.

Ketty Valencio
Escritora e proprietária da Livraria Africanidades

Foto: Gica TV

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