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Sobre a dor e sofrimento de jovens paulistanos

Nós organizações, movimentos e grupos abaixo assinados temos buscado firmemente transformar a forma como a sociedade trata a juventude no Brasil e, especificamente, na nossa cidade. Essa luta, que vem de muitos anos, está comprometida sobretudo em reverter uma ideia negativa e preconceituosa a respeito dos jovens brasileiros, frequentemente tidos como um problema social a ser estancado. Assim como nós, uma parcela cada vez maior da população e de gestores públicos tem percebido que a ação governamental, ao invés de tentar controlar e proteger jovens olhando-os a partir do seu potencial de delinquência, deve apoiar o seu desenvolvimento integral, promovendo direitos, oportunidades e reconhecer a enorme diversidade de interesses e demandas da juventude.Não é por acaso que alguns projetos governamentais vêm alcançando enorme sucesso ao apostar na ação de jovens e na sua autonomia. Também não é à toa que temos hoje uma Secretaria Nacional de Juventude e que aprovamos recentemente o Estatuto da Juventude na Câmara dos Deputados. Sabemos que a consolidação da democracia passa por respeitar o jovem e por isso valorizamos cada uma destas conquistas, tantas delas obtidas na última década.É exatamente por termos avançado tanto, por termos trabalhado tanto para a construção de um país e de uma sociedade mais democráticos, que ficamos estarrecidos ao nos deparar com os recentes acontecimentos em São Paulo. Começamos 2012 dando muitos e muitos passos para trás.Logo nos primeiros dias do ano somos surpreendidos por uma ação coordenada entre Estado e Prefeitura dirigida à região conhecida como “Cracolândia”, no Centro da cidade. Com o objetivo alegado de “sufocar os crimes”, a Ação Integrada Centro Legal tenta intervir nessa área ocupada por uma grande quantidade de dependentes químicos, em especial usuários de crack, grande parte deles, jovens. A estratégia traçada, segundo o coordenador estadual de Políticas sobre Drogas, Luiz Alberto Chaves de Oliveira, passa pela intervenção ostensiva da PM junto a supostos traficantes e criminosos e por infringir “dor e sofrimento” aos usuários para que estes busquem então o tratamento.A fala de Oliveira é, no mínimo, estranha e contraditória se considerarmos que o órgão do qual é servidor está ligado à Secretaria de Estado da Justiça e da Defesa da Cidadania. Além disso, estratégia e princípios utilizados e defendidos pelo representante do poder público estadual têm sido avaliados como frágeis e inadequados por especialistas. Ao invés de intervir de forma articulada entre diferentes áreas, dando conta dos graves problemas sociais e de saúde, Prefeitura e Estado parecem privilegiar a truculência e o flagrante desrespeito aos direitos humanos – utilizando inclusive bombas de efeito moral e balas de borracha contra usuários de droga (http://www.youtube.com/watch?v=89kbDtCcrHs). Assim, vemos jovens sofrendo a violência injustificada do Estado.No dia 09 de janeiro outra ação do governo estadual, por meio da sua Polícia Militar, contribuiu para completar a nossa perplexidade. No campus da USP Butantã um sargento da PM se desentende com estudantes, agride um jovem e chega a sacar, de forma muito perigosa, a sua arma. A cena, registrada em vídeo (http://www.youtube.com/watch?v=iNAolrMSioU) , mostra que o policial escondeu sua identificação e, sob olhar de outros colegas de corporação, intimidou vários jovens, até escolher e agredir um deles, exigindo uma comprovação de que este era estudante “uspiano” – embora não haja essa restrição para entrada no campus.Como bem ilustram os dois casos, a ação violenta do Estado não é dirigida à juventude de forma igual; ela atinge sobretudo alguns grupos específicos, como jovens de segmentos de baixa renda, pessoas em situação de rua e a população negra, num processo nefasto de re-vitimização. A seleção pela aparência, bastante comum nas ações policiais e repressivas, se baseia em um conjunto de estigmas construídos em cima da juventude e de certos grupos sociais, em flagrante desacordo com os direitos humanos. Ações como estas acabam por reforçar a incapacidade de governos em reverter ciclos que perpetuam a desigualdade e o preconceito.Isto é apenas uma mostra de uma coleção de equívocos de políticas públicas pensadas e executadas à revelia de direitos de cidadãos e cidadãs na cidade de São Paulo. E, especialmente, evidencia como essas ações governamentais partem de uma visão distorcida da juventude e acabam por afetar os jovens paulistanos, negando-lhes direitos ao invés de propiciar o seu acesso.A tendência é que as autoridades venham a público minimizar os efeitos negativos de suas ações, procurando colocar os erros em indivíduos, como no caso do policial na USP, que já foi afastado junto com mais outro colega. Esperamos sim que esses profissionais sejam responsabilizados. No entanto, tais respostas não podem tentar encobrir aquilo que são erros políticos e/ou a ausência de uma ação pública coerente com princípios de uma sociedade democrática, capaz de tratar todas pessoas como sujeitos de direitos.O ano começa mal e por isso não podemos deixar de manifestar nosso profundo repúdio aos acontecimentos recentes. Sentimos a dor e sofrimento destes jovens. Lamentamos o uso da intimidação e da truculência como instrumento de trabalho de agentes públicos, seja numa universidade ou nas ruas por onde transitam usuários de drogas. Mais uma vez renovamos nosso compromisso em construir políticas públicas eficientes e pautadas pelo respeito e pelo fortalecimento das estruturas democráticas. Esperamos o mesmo de nossos interlocutores. Por um 2012 bem diferente daqui para frente.Ação Educativa – Assessoria Pesquisa e InformaçãoAracati – Agência de Mobilização SocialCidade Escola AprendizComunidade CidadãECOS – Comunicação e SexualidadeEquipe Técnica do Programa Jovens UrbanosGT de Juventude da Rede Nossa São PauloInstituto Paulista de JuventudeInstituto PolisSecretaria de Juventude da União dos Movimentos de Moradia de São PauloSecretaria Executiva da Rede Nossa São PauloViração Educomunicação

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