agosto de 2008 - Nº 25

“Nova Agenda” gera polêmica e não inclui diálogo com a sociedade

Em agosto de 2007, a Secretaria de Estado da Educação de São Paulo (SEE) divulgou um conjunto de metas, ações e medidas, intitulado “Uma nova agenda para a educação pública”. Na justificativa, afirmava que os últimos censos escolares e as avaliações de aprendizagem apontam que “o desempenho insuficiente do sistema” é o principal problema da educação pública de São Paulo.

Para melhorar a qualidade da educação no Estado, foram estabelecidas dez metas para serem atingidas até 2010, entre elas: todos os alunos de 8 anos plenamente alfabetizados; redução das taxas de reprovação da 8ª série e ensino médio; aumento de 10% no desempenho no ensino fundamental e no ensino médio, nas avaliações estaduais e nacionais; atendimento de 100% da demanda da educação de jovens e adultos e com currículo profissionalizante
diversificado.

Foram também anunciadas ações relacionadas a cada uma das metas (ver páginas 10 e 11) e, por fim, cinco medidas para a implantação das ações: criação da função professor coordenador e seleção de 12 mil docentes até dezembro de 2007; concurso para 300 novas vagas de supervisor de ensino e revisão de suas atribuições; fortalecimento do papel do diretor da escola na liderança do processo
de implantação do modelo de gestão; criação de grupo de trabalho para implantar o ensino fundamental de nove anos; e criação de comissão organizadora do Plano Estadual de Educação.

O anúncio do plano, batizado de São Paulo Faz Escola, não gerou controvérsias, nem mesmo sobre a necessidade de um novo conjunto de metas, quando o Estado de São Paulo sequer fez o balanço do cumprimento daquelas estabelecidas no Plano Nacional de Educação ou informou como pretende atingir os compromissos firmados com o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), formulado em 2007.

Polêmicas

Os primeiros 45 dias do ano letivo foram destinados à recuperação das aprendizagens em Português e Matemática, no segundo segmento do ensino fundamental e do ensino médio. O Jornal do Aluno, material distribuído pela SEE para o período, foi bastante criticado, não apenas pelos inúmeros erros gramaticais e equívocos de conteúdo que continha, mas também por cercear a autonomia pedagógica dos professores, como demonstram as entrevistas nas páginas 16 e 17 desta edição.

Na tentativa de uniformizar a aprendizagem em toda a rede de ensino, a SEE também está distribuindo, a cada bimestre, a série “Cadernos do Professor”, com orientações sobre o conteúdo a ser seguido em cada uma das disciplinas do segundo segmento do ensino fundamental e do ensino médio. Novamente, houve críticas sobre a limitação da autonomia dos professores, desconsideração dos planos
políticos pedagógicos das escolas (ver páginas 8 e 9) e das Diretrizes Nacionais Curriculares.

A resposta da SEE aos comentários foi responsabilizar o excesso de autonomia das escolas pela insuficiente qualidade da educação paulista.

Ofício docente

Além de estabelecer o currículo, a SEE implementou medidas que incidiram diretamente sobre o cotidiano docente. A premiação financeira das equipes das escolas abriu um intenso debate entre profissionais da educação, empresários e setores da sociedade civil. Atores vinculados ao setor empresarial defenderam a lógica da competição, que prevê a premiação dos melhores profissionais – e alguns lamentaram não haver punição para os que não atingissem as metas esperadas. Outros, foram radicalmente contrários.

No debate público, chamou a atenção a ausência de informações confiáveis sobre a eficácia da política de bônus salariais para a melhoria da qualidade de ensino. Em entrevista nesta edição (ver página 18), Nathália Cassetari, mestranda da FE-USP, que pesquisa políticas de premiação de professores, relata que não há informação sobre o impacto dessas iniciativas na melhoria da qualidade deensino, porque todas elas tiveram curta duração.

Outras duas iniciativas incidiram sobre o trabalho docente. Em abril, o Projeto de Lei Complementar 1041/08, reduziu a seis o número de ausências anuais com pedidos médicos e, em maio, o Decreto 53.037/08 limitou as possibilidades de transferências entre escolas dos professores efetivos, que ingressarem na rede a partir da sua aprovação, e estabeleceu o concurso público regionalizado.

O conjunto de medidas foi criticado pelos sindicatos da categoria, por visarem apenas a controlar o exercício docente sem que houvesse qualquer ação para a melhoria das condições de trabalho. A busca de soluções para a superlotação das salas de aula, a inadequação dos prédios, a ausência de tempo para o preparo das aulas, a morosidade
na distribuição do material pedagógico e outros fatores insistentemente apontados por sindicatos e pesquisadores não constam da “Nova agenda para a educação pública”.

Mudanças curriculares

Especificamente para o ensino médio noturno, foi introduzido o curso técnico em administração, desenvolvido em parceria com o Centro Paula Souza, na Região Metropolitana de São Paulo. De acordo com a SEE, no segundo semestre de 2008, algumas cidades do interior do Estado introduzirão o ensino profissionalizante por meio de parceria com instituições privadas.

As reflexões de pesquisadores e professores da rede pública sobre as conseqüências das mudanças curriculares no ensino médio estão apresentadas na páginas 12 e 13.

Para a educação de jovens e adultos, ensino médio, a proposta é oferecer o Telecurso 2000 + 10, em parceria com a Fundação Roberto Marinho e o Centro Paula Souza, além da adoção do Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja), organizado pelo Ministério da Educação (MEC).

Falta de diálogo

A formulação e a implementação da “Nova agenda” foram marcadas pela ausência de interlocução da SEE com a comunidade escolar e a sociedade civil. A opção foi a divulgação por meio da imprensa (ver página 3).

Para justificar as ações, a SEE atacou a autonomia da escola, a conduta dos professores e a atuação das universidades públicas na formação dos professores. Confira nas páginas 6 e 7 o balanço do debate entre Romualdo Portela, professor da FE-USP; Maria Alice Setúbal, diretora-presidente do Cenpec; Carlos Ramiro, presidente da Apeoesp; e Ísis Brum, repórter do Diário de S. Paulo, sobre o papel dessas instituições na formulação de políticas educacionais.

Sobre a ausência de diálogo com os profissionais da educação na formulação do plano, a SEE alega que recebeu cerca de 3 mil “idéias” por meio da página eletrônica “São Paulo faz escola” (www.saopaulofazescola.sp.gov.br) e que as melhores foram utilizadas na formatação das propostas curriculares. A página foi criada em outubro de 2007 e abriga videoconferências e as versões eletrônicas dos “Cadernos do Professor”.

Algumas dúvidas

Quase um ano depois do anúncio da “Nova Agenda”, alguns aspectos ainda precisam ser explicados. A relação com o MEC é um deles – último Estado a aderir ao PDE do governo federal, São Paulo criou seu próprio índice educacional para aferir o desempenho dos alunos. A SEE não explicou por que destinar recursos financeiros e humanos, além do tempo das escolas, para tal fim, sendo que há o Indicador de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) do MEC, que é o parâmetro nacional de acompanhamento do cumprimento das metas do plano federal.

Em termos de recursos financeiros, foi anunciado o investimento de R$ 1,7 bilhão em obras e reestruturação da rede de ensino, mas não ficaram explícitos qual a fonte deste recurso e o quanto o Fundeb impactou sobre a ampliação dos recursos na educação paulista.

Por fim, a “Nova Agenda” prevê ações que serão desenvolvidas por empresas privadas, como cursos de computação e língua estrangeira, mas não houve explicação sobre as razões de se optar por transferir recursos públicos à iniciativa privada, tampouco dos critérios de contratação e formas de controle social sobre sua atuação.

 

Edições
Anteriores

 | Expediente |
 Para cancelar o recebimento, responda esse email com o assunto "Cancelamento"