A pesquisa ouviu jovens do projeto Mude com Elas, uma parceria da Ação Educativa com a Câmera de Comercio da Alemanha;
Promovido pela Ação Educativa, o estudo “Ocupar o futuro” aborda a relação de jovens mulheres negras e suas perspectivas para o mercado de trabalho, para além de dados estatísticos. Com isso, a publicação busca promover a escuta destas mulheres, com depoimentos que refletem não somente o cenário de desigualdades e preconceitos, mas, sobretudo, busca apontar quais são os horizontes possíveis quando pensamos mundo do trabalho e juventude negra .
O estudo integra as ações do projeto Mude com Elas, parceria da organização junto à Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha em São Paulo (AHK São Paulo) e o escritório de Terre des hommes Alemanha (Tdh). A iniciativa envolve um trabalho de formação, pesquisa e inserção de jovens mulheres negras no mercado de trabalho.
As declarações utilizadas no estudo também podem ser conferidas na web série “Future-se”. Quatro episódios estão disponíveis no www.youtube.com/acaoeducativa e em 2022 a intenção é lançar novos vídeos com a participação de outras jovens contempladas do Mude com Elas e lideranças femininas da rede de multiatores da iniciativa.
Lugar de fala
O principal objetivo do estudo foi organizar intuições sobre a relação entre as jovens negras e o mercado de trabalho a partir das experiências desenvolvidas ao longo do Mude com Ela. Assim, o documento está pautado em diálogos sobre o contexto no qual essas mulheres estão inseridas.
Algumas delas dizem, por exemplo, que trabalhar é uma obrigação e que nunca sentiram prazer no que estavam fazendo, como se não houvesse uma escolha. Em outro momento apontam não ser “máquinas” para engrossar as engrenagens do capitalismo, destacando a importância de estabelecer novas relações com o trabalho. Encontrar pares – pessoas que enfrentam as mesmas barreiras – foi outro aspecto levantado para “suportar melhor o dia a dia”.
Quanto ao racismo as jovens ouvidas chamam a atenção para o que acontece em todos os ambientes, como nas escolas: “raramente se vê um professor negro, uma professora negra, um gay, uma pessoa trans dando aula. É sempre na cozinha, na faxina.” Nesse contexto, o estudo enfatiza o quanto a falta de representatividade estimula uma espécie de “epidermização da inferioridade”.
De acordo com o estudo as relações de afeto e os exemplos de mulheres negras que superaram todos os desafios é um sopro de esperança perante as dificuldades: “tenho a sorte de ter uma chefe negra, mulher” contou uma delas.
Ao final, a pesquisa destaca o exemplo de uma jovem como metáfora do que seria ocupar o futuro. “Faz duas semanas que sai de um salão e agora eu voltei a trabalhar por conta própria. Estou trançando. A minha sogra abriu um espaço no salão dela pra mim e eu coloquei a minha cadeira lá”.
“Colocar a cadeira lá” pode ser uma forma de ocupar um futuro imaginado mas com potencial para se tornar realidade.
Estatísticas
Apesar do foco nas vivências de 10 jovens atendidas pela iniciativa, o estudo também considerou dados estatísticos. Na visão dos pesquisadores essas informações são fundamentais para construção e efetivação de políticas públicas. Entre os levantamentos utilizados está a Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios Contínua (PNAD, 1 trimestre de 2021) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A pesquisa aponta, por exemplo, percentual maior de mulheres desempregadas na comparação com os homens: 17,9% contra 12,2%. Já no recorte racial: o desemprego afeta 18,6% das pessoas pretas contra 11,9% das brancas.
Outra referência usada no estudo é a Pesquisa Juventudes e a pandemia do Coronavírus (2021) do Conselho Nacional de Juventude, com um relatório especial sobre a cidade de São Paulo. Em síntese os pesquisadores observaram que a maioria dos jovens se encontram dependentes financeiramente, mesmo que quase metade esteja trabalhando. No caso das juventudes negras, as atividades de complementação à renda se deram na prestação de serviços para pessoas ou empresas, parcial ou totalmente presencial.
Ao analisar esses dados estatísticos de diferentes fontes, os pesquisadores ponderaram a dificuldade na constituição de informações sobre juventude e acesso ao trabalho que considerem a interseccionalidade (com raça/etnia, gênero, orientação sexual, classe); a transversalidade de políticas (trabalho, saúde, educação, lazer…) e a territorialidade nos cruzamentos estatísticos/narrativos.